Uma
retaliação dos países árabes ao Brasil por conta de declarações pró-Israel do
presidente eleito Jair Bolsonaro teria impacto negativo nas exportações
brasileiras a médio prazo, especialmente de carnes, segundo especialistas em
comércio exterior ouvidos pelo Estado. O Brasil é o maior exportador de carne
Halal do mundo, isto é, com os animais abatidos sem sofrimento, seguindo os
preceitos da religião muçulmana. Nos frigoríficos certificados por religiosos
muçulmanos, as linhas de abate, por exemplo, estão voltadas para a Meca.
“Não acredito em rompimento de
relações diplomáticas e comerciais, mas os árabes poderão preferir outros
concorrentes brasileiros, não certificar novas plantas para o abate Halal ou
não renovar a certificação”, alerta Welber Barral, ex-secretário de Comércio
Exterior do Ministério de Indústria e Comércio. Ele destaca que o mercado árabe
paga preço adicional pelo produto Halal. No ano passado, as exportações de
frango Halal, por exemplo, renderam ao País US$ 3,2 bilhões e responderam por
45% das receitas totais de vendas externas do produto, segundo dados da
Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).
Para José Augusto de Castro, presidente
da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), “algumas palavras políticas
hoje poderão ter reflexos negativos na área econômica”, ressalta. Na sua
opinião, todos os desencontros que ocorreram na semana pós-eleição mostram a
descoordenação da novo governo. “O reflexo negativo recai na economia e, no
caso das exportações, o dano só não será maior porque não há fornecedores
alternativos a alguns produtos”, pondera.
Castro destaca que, juntos, os países
do Oriente Médio representaram 4% das exportações totais brasileiras de janeiro
a outubro deste ano, cerca de US$ 8 bilhões, uma participação superior à da
África , que foi de 3,4%. O economista ressalta que os países árabes têm muito
dinheiro e, por isso, são mercados com potencial de crescimento muito grande.
O presidente da AEB lembra que o
Egito é um dos poucos países que o Brasil tem acordo comercial porque negocia
muitos produtos, cerca de 800. Isso significa que, a princípio, a retaliação
que o país poderia fazer em relação ao produtos brasileiros não seria imediata
porque existe um precedente que é o bom relacionamento.
De toda forma, o mercado já coloca no
radar os efeitos negativos no lado comercial. A XP Investimentos, por exemplo,
informou, por meio de nota, que “ainda que nada tenha sido confirmado, a mesa
de Commodities da XP Investimentos chama a atenção para os possíveis impactos
futuros desta medida ao agronegócio brasileiro, seja por parte do Egito ou por
parte de algum dos outros países envolvidos no conflito Palestina/Israel”. O
Egito foi o 3.º maior comprador da carne bovina brasileira, 146,95 mil
toneladas e participação de 12,1%.
Procurada, a Abiec, que reúne os
exportadores de carne não quis se pronunciar. A ABPA, por meio de nota, disse
que “acredita que esta questão será novamente avaliada no início do novo
governo.” Para o diretor da MB Agro, José Carlos Hausknecht, o estremecimento
das relações entre Brasil e Egito pode afetar as vendas de açúcar para os
países árabes. O Brasil exporta cerca de 28 milhões de toneladas de açúcar por
ano-safra. Só para o Egito, foram embarcadas no ano passado 1,5 milhão de
toneladas. “Não dá para se ter um impacto sobre as exportações ainda, mas o
bloco árabe é um importante mercado para o Brasil”, disse Hausknecht. Procurada
a União da Indústria da Cana-de-açúcar (Unica) não se posicionou.
Nenhum comentário:
Postar um comentário