quinta-feira, 12 de abril de 2018

Mandado de segurança permite à Zemax Log descumprir norma de afretamento

       Uma decisão da 8ª Vara da Seção Judiciária de Brasília (SJDF) deu à Zemax Log Soluções Marítimas o direito de descumprir um artigo da resolução 1/2015 da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), que trata da obtenção de autorizações para afretamento de embarcações estrangeiras por empresas brasileiras de navegação (EBNs). Em outubro do ano passado, o juiz federal Francisco Alexandre Ribeiro concedeu mandado de segurança individual para a Zemax contra a superintendência de outorgas da agência.
       Na prática, o mandado impede a Antaq de exigir da empresa os requisitos de tonelagem de porte de bruto previstos na norma e a obriga a emitir o certificado de autorização de afretamento. “Se a própria Antaq reconhece a existência de dificuldades na interpretação da norma, na medida em que seus setores internos divergem entre si, não me parece razoável obstar a atividade econômica da impetrante exigindo-lhe a satisfação de requisito que não se encontra claramente disposto na legislação”, concluiu o juiz federal.
       Em consulta prévia à Antaq no ano passado, a Zemax recebeu resposta favorável do então diretor-geral, Adalberto Tokarski. Em maio daquele ano, um ofício assinado por ele (158/2017) afirmava que, após circularização no Sistema de Afretamento na Navegação Marítima e de Apoio (Sama) e constatada insuficiência da frota nacional para efetuar determinada operação de transporte de hidrocarbonetos, pode ser autorizado o afretamento de embarcação estrangeira pela EBN sem limitação de tonelagem de porte bruto e sem existência de embarcação de tipo semelhante em sua frota. A regra vale na modalidade a casco nu sem suspensão de bandeira, por tempo ou por viagem.
       No processo, a Zemax afirmou que posteriormente foi surpreendida por exigência do requisito de tonelagem, o que caracterizou o não atendimento de seu pleito administrativo. A empresa então cobrou da agência reguladora a observação da interpretação anterior. Porém, mesmo após a ordem da diretoria-geral para adoção das medidas necessárias, a agência deixou de atender o pleito da Zemax e a sugeriu aguardar manifestação da diretoria colegiada sobre alteração ou não da norma. Em razão dos custos envolvidos na operação de afretamento contratada previamente, a empresa solicitou liminar, que foi deferida e, na sequência, seus efeitos foram estendidos. O Ministério Público Federal (MPF) manifestou-se pela negativa do mandado de segurança.
       A Zemax relatou no processo que o ofício gerou expectativa na empresa de que as circularizações protocoladas na sequência não seriam condicionadas à limitação de tonelagem de porte bruto e que assim ela enfim obteria a autorização de afretamento. O entendimento da Zemax é que o artigo 5º da norma (inciso III, alínea "c") não contempla nem limite de tonelagem nem propriedade de embarcação de tipo semelhante para a circularização e afretamento de embarcação para transporte de hidrocarbonetos e derivados. "Num ambiente de negócios (...), principalmente no ramo da navegação, dada a sua peculiar regulação, é imperioso que haja um mínimo de previsibilidade, a fim de que seus agentes possam operar com estabilidade e segurança jurídica", considerou o juiz.
       Em abril de 2017, os especialistas em regulação de serviços de transportes aquaviários da agência, Diego Rafael Barboza Amorim e Rodrigo Guimarães Trajano, assinaram nota técnica a partir de uma demanda da gerência de regulação da navegação marítima da superintendência de regulação (GRM/SRG). A nota considerou que o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional, ou de derivados básicos de petróleo produzidos no país, trata-se de navegação de cabotagem e abriu possibilidade de os certificados de autorização de afretamento (CAAs) serem obtidos pela EBN sem limitação de tonelagem de porte bruto ou embarcação de tipo semelhante em sua frota.
       Em julho de 2017, o diretor Mário Povia, relator do processo administrativo na Antaq, considerou em seu voto que a tramitação da consulta foi equivocada. Ele alegou que posicionamento adotado pela gerência de regulação, que respaldou ofício 158/17, não contou com a consulta à superintendência de outorgas e à gerência de afretamento da navegação. "Não há qualquer celeuma a respeito da matéria (artigo 5º), cuja discussão foi amplamente abordada no bojo da nota técnica 06/2015, que tratou de forma cristalina do tema”, argumentou Povia.
       Em março deste ano, o diretor Francisval Mendes divergiu do posicionamento do relator e pediu vistas do processo administrativo, alegando complexidade do assunto e a importância de proteger a segurança jurídica dos atos da agência. Ele observou que existem decisões judiciais desfavoráveis sobre o tema que servem de alerta à agência quanto à necessidade de revisitar a norma e seus fundamentos. Mendes entendeu que a norma é clara quanto ao critério de tonelagem para emissão do CAA, independentemente do tipo de carga. "O que não está suficientemente elucidado nos autos, e aí reside o equívoco da SRG, é a necessidade do critério da tonelagem, sob o aspecto técnico para a emissão do CAA", votou.
       Ele ressaltou em seu voto que a o espírito da Lei do transporte aquaviário no Brasil (9432/1997) é a proteção da frota nacional a uma concorrência desequilibrada com empresas estrangeiras, o que leva à indagação sobre se a limitação de tonelagem é o meio eficiente para inserir no âmbito protetivo da lei. "A princípio, pela própria edição da resolução 01/15, após audiência pública, a conclusão lógica é de que é requisito necessário e eficiente. Mas, ante os questionamentos surgidos, há indicativo para que esta agência busque em suas entranhas se sua norma está a atingir a proteção pretendida pela lei ou se está a afastar", avaliou em seu voto.
       Mendes sugeriu análise técnica do tema para defesa da norma vigente ou a revisão de seu texto, observado o comando da Lei 9432. Ele não viu razões para revogação do ofício 158/17 e votou por instituir um grupo de trabalho para estudos e apresentação de parecer técnico conclusivo sobre o artigo 5º da norma no prazo de 60 dias.

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