segunda-feira, 5 de março de 2018

Tokarski aponta perseguição a empresas de navegação na Antaq

         Em depoimento ao Ministério Público Federal em Brasília (MPF-DF), que apura denúncias de abuso de poder de servidores da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e de uma suposta formação de cartel na cabotagem, o ex-diretor geral da agência, Adalberto Tokarski, indicou uma perseguição por parte de membros do comando da agência à empresa de navegação Posidonia Shipping. Tokarski, que não é alvo da denúncia, indicou que membros da gerência e da diretoria da Antaq tiveram atitudes que podem ser interpretadas como abusivas e prejudiciais à empresa de navegação carioca.
         O inquérito foi aberto no núcleo de combate à corrupção do MPF após ação iniciada pela Posidonia, que entrou no mercado em 2013 e relata obstáculos para atuar na cabotagem brasileira. O depoimento prestado em junho de 2017 veio a público na última quinta-feira no site do Estadão, que teve acesso exclusivo às imagens. O mandato de Tokarski acabou em fevereiro deste ano. No depoimento, o ex-diretor geral disse que o entendimento dele em alguns processos relacionados à empresa de navegação era diferente dos demais diretores (Mario Povia e Fernando Fonseca). Tokarski citou que, na época da outorga, ele entendeu que a embarcação em construção da Posidonia serviria de garantia para autorizar a operação da empresa, porém os outros diretores avaliavam que não.
         Ele também considerou que houve demora em decisões sobre afretamento envolvendo a Posidonia após a empresa ter denunciado servidores da agência em uma de suas ações. "Num outro momento, a gente percebe que houve às vezes ações de procrastinação para demorar o atendimento da empresa. Houve determinado momento em que foi feita uma denúncia e, por conta dessa denúncia, barraram o afretamento. E, nesse caso específico, eu estava diretor, chamei pessoal da área técnica e falei: 'vocês estão malucos. Não foi apurado nada ainda e com base na denúncia você já cancela uma autorização de afretamento'. Isso não pode acontecer”, disse em seu depoimento.
         Tokarski ressaltou que não vê a resolução 01/2015 como totalmente restritiva. Ele acrescentou que, em alguns pontos colocados sobre a norma que trata das regras de afretamento, ele foi voto vencido e a proposição permaneceu como estava. “Com referência a essa resolução (...) acho que talvez tenha vindo no sentido de evitar que empresas de papel ficassem atuando. Mas, na hora que se dá direito para uma empresa que está com embarcação em construção e se dá direito para todo mundo afretar outras, também está permitindo que a empresa construa, afrete, cresça e assim por diante. Se limita isso aí, está sendo mais restritivo”, comentou.
         Ele também declarou que houve multa aplicada à empresa que ele só tomou conhecimento depois de publicada. “A Posidonia foi multada lá atrás em R$ 1,2 milhão e eu especificamente nesse momento era diretor e fiquei sabendo só depois de publicado no Diário Oficial”, afirmou. Tokarski explicou que existe uma espécie de hierarquia na agência onde só chegam para recursos na diretoria multas com valores mais altos. Dependendo dos valores das infrações, eles são aplicados pelas superintendências ou gerências responsáveis. "Nesse caso específico - até questionei - foram muitas multas num mesmo valor pequeno. E acho que deveria ter sido levado à diretoria, e não foi levado", ressaltou.
         O ex-diretor relatou ainda a emissão de ofícios de superintendências que podem ocasionalmente livrar algumas empresas de multas, se sobrepondo às normas. “Recentemente, emiti ofício meu e da diretoria-geral colocando que ofício não tem poder de sobrepor uma norma, que ela é discutida, passa em audiência pública, é um processo robusto”, contou durante seu relato.
         Tokarski  contou que demonstrou aos atuais diretores (Mario Povia e Francisval Mendes) a preocupação de o gerente de afretamento, Rômulo Castelo Branco, continuar na função. "Em relação ao Sr. Rômulo especificamente, eu externei para os dois atuais diretores — um é bem mais novo — da preocupação dele continuar. Especificamente vejo alguns expedientes que não me dão tanta confiança, solicitei no sentido de a gente mudar", relatou.
         O ex-diretor explicou que a escolha de cargos comissionados, como o de Castelo Branco, passam pela diretoria colegiada. "No caso do Rômulo, o diretor Mario Povia não concorda. O Dr. Francisval está chegando agora. Diante de mais expedientes, de uma preocupação que estou tendo com esse processo, vou propor à diretoria colegiada na sequência (...) vou pedir que processos dessa empresa fiquem em sobrestado. Com esse inquérito pode ter dentro da casa um olhar não agradável para com a empresa", disse em seu depoimento.
         "Vou solicitar que esses processos realmente não andem porque pode ficar um pouco maculado qualquer decisão. Pretendo esperar auditoria para trazer mais elementos porque na hora que coloca no papel, pedindo, por exemplo, afastamento do servidor Romulo: não tenho confiança, mas não consigo decidir sozinho", acrescentou.
         Questionado sobre uma suposta influência de empresas de navegação na norma, ele comentou apenas sobre a conduta dentro da agência em relação à Posidonia. "Não posso afirmar 'em favor da ABAC' [Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem]. Acho, no meu entendimento, vemos claro às vezes um posicionamento contrário a essa empresa. Ao longo dos anos está dando para perceber isso", resumiu.

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