segunda-feira, 27 de março de 2017

Movimentação de cargas no Porto do Rio de Janeiro cai três vezes mais que a média nacional

           Os portos do país foram afetados pela crise, mas, no Rio, o efeito foi mais intenso. Na média, os terminais portuários tiveram queda de 4% na movimentação de contêineres no ano passado. No Porto do Rio, o recuo foi três vezes maior e chegou a 15,6%, de acordo com dados do Centro Nacional de Navegação Transatlântica (Centronave). Em 2015, o Rio já havia tido queda de quase 20%.
         O recuo na movimentação tem impacto também na arrecadação. Dados da Secretaria de Transportes indicam que a arrecadação de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) a partir da movimentação de carga no Porto do Rio passou de R$ 2,39 bilhões em 2014 para R$ 1,66 bilhão em 2015. Os dados de 2016 não estão fechados, mas fontes do setor portuário e do governo estimam queda entre R$ 800 milhões e R$ 1 bilhão, mesmo considerando que uma pequena parcela do mercado tenha sido conquistada pelo Porto de Itaguaí. Procurada, a Secretaria de Fazenda não faz projeções, embora destaque que o Porto do Rio correspondeu a cerca de 15% da arrecadação total de ICMS com importações no ano passado.
         A perda de mercado do Porto do Rio é explicada por uma combinação de fatores. Os portos públicos vêm perdendo participação em contêineres para novos terminais privados criados após a lei de 2013 que facilita a instalação de portos privados, mas o Rio vem caindo mais. O nível de ociosidade média fica na faixa dos 80%, segundo o sindicato dos operadores portuários. Muitos dos novos portos são especializados em contêineres — nos quais são transportados produtos de maior valor agregado — com estrutura verticalizada, que facilita a negociação com armadores e tem vantagens em custos trabalhistas. Não bastassem os efeitos da crise, o Porto do Rio também sofre com problemas de dragagem no canal de acesso, que impedem a chegada de navios de grande porte, usados em rotas na América do Sul com mais frequência a partir de 2014. A Marinha impôs restrições a manobras. As maiores dimensões das embarcações que atracam em portos brasileiros são de 336 metros de comprimento por 48 metros de largura. No Rio, só podem chegar navios de até 300 metros de comprimento por 40 a 42 metros de largura.
         — A crise econômica não é a principal causa para a queda da movimentação nos últimos anos. O Porto do Rio é competitivo, tem custo menor para o armador, mas tinha esse problema da dragagem. Isso fez com que muitas empresas trocassem o porto por outros — afirma Luiz Henrique Carneiro, presidente do Sindicato dos Operadores Portuários e diretor-presidente da Multi-Rio, terminal de contêineres, e da Multi-Car, do grupo Multiterminais.
         A restrição do calado (profundidade mínima de água necessária para a embarcação flutuar) é barreira relevante, que pode impor risco aos navios ou atrasar operações. Hoje, 40% dos navios de grande porte que circulam na rota entre América do Sul e Ásia não podem atracar aqui, segundo Carneiro.
— Esses problemas vêm gerando dificuldades para os grandes navios cargueiros, inclusive em custos operacionais, como a necessidade de mais rebocadores a cada manobra de atracação ou desatracação — disse Claudio Loureiro de Souza, diretor-executivo do Centronave, que reúne 22 armadores, brasileiros e internacionais, responsáveis por 95% da carga em contêineres do comércio exterior brasileiro.
         Loureiro, da Centronave, resume os problemas do terminal em quatro fatores: sofrível sistema de acesso terrestre, crise do setor de petróleo e gás, segurança no estado e problemas de acesso marítimo ao porto, notadamente a dragagem. Entre os terminais que estão roubando participação do Rio e, por consequência, aquecendo as economias em suas regiões estão aqueles localizados em Santa Catarina, como Itajaí e Navegantes, o que mais cresceu no ano passado.
         Para Riley Rodrigues, gerente de Estudos de Infraestrutura da Firjan, o porto do Rio tem vantagens como localização, proximidade dos locais de origem e destino das encomenda e tempo menor de liberação de cargas quando é necessária vistoria física. Em dados que serão publicados pela Firjan, ele diz que o tempo médio de liberação no Rio é de 12 dias, contra 15 de Santos: — Três dias fazem grande diferença porque a carga pode chegar ao destino antes ainda de sair de Santos, mesmo com o trânsito.
         Segundo o presidente do Sindicato dos Práticos do Estado do Rio (especialistas que fazem as manobras para a atracação dos navios nos portos), Everton Schmitd, a maior dificuldade atual é que a área de manobra é estreita: o navio tem de entrar de frente no terminal e, depois, ser manobrado com a ajuda de, no mínimo, dois rebocadores:
         — O que faltava era a dragagem. Não adiantava só aumentar a profundidade, mas também alargar o canal. A manobra é mais demorada e complexa por causa da geografia da região, mas os práticos sabem fazer isso bem.
         Em 2011, o porto passou por obras de dragagem, mas elas não tiveram o efeito esperado. No mês passado, foram concluídas novas obras e o terminal aguarda a homologação da Marinha. Carneiro estima que o porto poderá receber navios de grande porte no 2º semestre.
         — O porto poderá receber navios que transportam até 10.000 TEU (medida usada para calcular volume em contêiner), enquanto antes só podia receber navios com cerca de 6.000 TEU. Quase dobra a capacidade — disse, destacando que as empresas privadas que operam os terminais investiram quase R$ 1 bilhão nos últimos anos.
         A dragagem também cria expectativa do ponto de vista do recolhimento de tributos. A Secretaria de Fazenda avalia que a obra pode “atrair novas empresas ao estado, ao facilitar o transporte de mercadorias, o que poderia gerar aumento na arrecadação de ICMS”.
         Segundo o presidente da Associação dos Usuários dos Portos do Rio (Usuport-RJ) e da Comissão Permanente para Assuntos Portuários da Prefeitura do Rio de Janeiro (CPAP-Rio), André de Seixas, após a dragagem, ainda existirá o gargalo rodoviário:
         — Precisamos, ainda, equacionar os acessos terrestres, e isso vem sendo prioridade na comissão. Temos pela frente, de forma bem concreta, dois grandes projetos: a Via Alternativa e Avenida Portuária.
Segundo Carneiro, a EcoPonte deve construir o viaduto que ligará a Avenida Brasil, na altura de Manguinhos, até o Porto do Rio, a chamada Avenida Portuária. A obra tem previsão de conclusão até 2020. Isso reduziria o fluxo de caminhões no fim da Avenida Brasil. O Sindicato dos Operadores Portuários negocia com governos federal, estadual e municipal a construção da Via Alternativa, por ruas internas do Caju até o Porto. A primeira fase foi feita há alguns anos. Falta concluir a segunda etapa. O gasto estimado é de R$ 80 milhões.
         Especialistas apontam a falta de segurança e conservação das rodovias de acesso, além do trânsito na Avenida Brasil em horários de pico. Para Nilson Carlini, consultor do setor, a localização urbana é um entrave para o Porto do Rio, que dificulta o acesso em terra e limita sua expansão.
Outras entidades do setor, como a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres de Uso Público (Abratec), adotam metodologia própria, mas seus dados também apontam recuo no movimento de contêineres do Rio, em 2016. O Porto do Rio é administrado por Docas, que não quis comentar o assunto.

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