A previsão da Organização Mundial do Comércio (OMC) para 2017 é que
as trocas mundiais crescerão em ritmo mais lento. A possibilidade de
maior protecionismo dos Estados Unidos com o governo de Donald Trump
aumenta as incertezas sobre o tema. Analistas confirmam que o
republicano traz insegurança, mas esperam que Trump recue em algumas
promessas de campanha e seja contido pelo Congresso norte-americano. No
Brasil, exportações e importações devem esboçar recuperação, mas
dependem também do comércio global.
O gerente de Comércio Exterior da Confederação Nacional da
Indústria (CNI), Diego Bonomo, diz que a tendência do setor privado em
relação a Trump é manter o compasso de espera. "Sempre há uma diferença
entre a retórica na campanha e aquilo que é a política do governo. O que
a gente tem acompanhado da montagem do ministério dele é que tem um
perfil pró-negócio."
Bonomo cita a nomeação do empresário Rex Tillerson, da gigante
petrolífera ExxonMobil, para secretário de Estado e de Steven Mnuchin,
ex-banqueiro do Goldman Sachs, para secretário do Tesouro. Segundo o
gerente da CNI, o nome crucial para o comércio exterior ainda não foi
anunciado, o do representante comercial dos EUA. O escritório, ligado à
Casa Branca, tem status de ministério.
"A gente também percebe que já houve uma mudança parcial no
discurso [de Trump]. Na campanha, tinha uma retórica de que acordos
comerciais são ruins, destroem empregos dentro dos Estados Unidos.
Agora, o discurso é que existem acordos bons e ruins, que é preciso
denunciar os ruins, manter os bons e modificar o que precisa ser
modificado", pondera Bonomo.
Para Welber Barral, da Barral M Jorge Consultoria, o acordo
comercial efetivamente em risco em 2017 é a Parceria Transpacífico (TPP,
na sigla em inglês), tratado de livre-comércio estabelecido em 2015
entre doze países banhados pelo Oceano Pacífico. Trump já avisou que
anunciará a saída dos EUA da parceria assim que tomar posse, no dia 20
de janeiro de 2017.
"Não se espera que haja grande evolução, pois ele já disse que não
vai assinar [a TPP]. Quanto a outros acordos em vigor, com certeza
vários grupos [nos Estados Unidos] são a favor deles e vão atuar para
evitar que haja uma denúncia. É o caso do Nafta [Tratado Norte-Americano
de Livre Comércio, que reúne EUA, Canadá e México e tem o Chile como
associado]."
Embora, de forma geral, uma postura mais protecionista dos EUA seja
ruim para o comércio mundial, a saída do país do Parceria Transpacífica
poderia beneficiar o Brasil, segundo Bonomo. "Se o Transpacífico for aprovado, tem dois efeitos sobre o Brasil:
um é que desvia o comércio, pois há alguns produtos que os EUA e países
vizinhos deixarão de comprar de nós para comprar de membros do acordo. E
também teria o efeito de desvio de investimento, pois, ao harmonizar
regras, você facilita que eles invistam uns nos outros. Se não for
aprovado pelos Estados Unidos, você deixa de ter esses efeitos. Isso
pode, indiretamente, beneficiar o país", explica o gerente da CNI.
A maior beneficiária da eventual saída dos EUA do acordo seria a
China. O país encara o Transpacífico como uma tentativa de diminuir sua
influência econômica na região, já que o tratado fortalece o Japão. Por
vários motivos, a gigante asiática será foco das atenções no ano que se
inicia.
As relações com os Estados Unidos, já estremecidas com o
Transpacífico, podem piorar com Trump. Welber Barral lembra que o então
candidato fez ataques à China durante a campanha. "Uma das promessas do
Trump é que ele teria maior equilíbrio na balança comercial com a China.
Ele vai tentar abrir mais o mercado chinês ou tentar adotar medidas
antidumping contra a China e, claro, isso gera uma quebra do comércio
internacional e afeta o mundo inteiro", analisa.
Recentemente, o presidente eleito dos EUA cometeu uma gafe
diplomática ao falar por telefone com a presidente de Taiwan, Tsai
Ing-wen, que ligou para parabenizá-lo pela vitória. O governo americano
evita contato com Taiwan para não desagradar a China, que considera o
país parte de seu território e nega sua autonomia. Após o telefonema,
Trump ainda foi ao Twitter para criticar os chineses. "Ele ainda vai dar
muito trabalho ao Departamento de Estado", brinca Welber Barral.
O presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB),
José Augusto de Castro, lembra ainda que, no fim de 2016, venceu o prazo
dado pela OMC para a China fazer ajustes e ser considerada uma economia
de mercado. "O Japão já declarou que [a China] não é [economia de
mercado]. A tendência é os Estados Unidos fazerem igual. O Brasil está
se fingindo de morto. Os grandes parceiros não reconhecendo a China,
isso vai provocar alguns probleminhas", analisa Castro.
No cenário incerto de 2017, a AEB prevê um superávit de US$ 51,65
bilhões para a balança comercial brasileira. Segundo José Augusto de
Castro, a expectativa é de uma recuperação das exportações e
importações, que estiveram em queda em 2015 e 2016. Nesses dois anos,
apenas o fato de as importações caírem em ritmo mais acentuado, por
conta da recessão, garantiu superávits.
"As exportações, exclusivamente por conta de commodities [algumas
registram alta de preços], é provável que tenham um aumento em 2017,
principalmente petróleo e minério de ferro. Acho que vai ter um aumento
também das importações. Mas a chance de errar esse ano é muito grande,
pois além de tudo nós temos o efeito Trump", avalia o presidente da AEB.
"Provavelmente vai aumentar um pouco exportação e importação. Um
total de 50% da importação brasileira é de insumos [para a indústria].
Quando você tem uma retomada do crescimento da economia, aumenta muito a
importação de insumos", acrescenta Welber Barral, lembrando que a
projeção para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2017 é de crescimento
entre 0,5% e 1%.
José Augusto de Castro considera a previsão de crescimento modesta e
destaca que há, inclusive, quem projete que a economia ficará "no zero a
zero". "[2016] foi o quinto ano de queda nas exportações. As reformas
[fiscais e econômicas] são importantes, mas demoram no mínimo dois anos.
A gente fica dependendo do câmbio."
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