O resultado da eleição presidencial dos Estados Unidos foi a notícia
mais impactante do ano de 2016 e também a maior incógnita para as
previsões econômicas globais. A única certeza é de que as
tendências protecionistas do futuro ocupante da Casa Branca, Donald Trump, devem redirecionar o curso do
comércio exterior, tanto no fluxo de mercadorias quanto na relação entre
os países.
A recente
exigência da China junto à OMC (Organização Mundial de Comércio) para
que o país seja reconhecido como economia de mercado já pode ser
considerada como o primeiro dos atritos com que os Estados Unidos e a
União Europeia terão de lidar. As rusgas entre as potências poderiam
significar vantagens para o Brasil. Mas, como era de se esperar, não
estamos preparados. Pelo contrário, “não temos preço e nem capacidade
para competir”, avisou o Presidente da Associação de Comércio Exterior
do Brasil, José Augusto de Castro.
Para ser uma economia plena de
mercado, as regras da OMC determinam que o país associado variem apenas
em função da oferta e da procura, e do custo de sua produção e
escoamento, com o mínimo de interferência do governo. Nesse item, a
reputação da China ainda deixa a desejar, uma vez que a atividade
comercial do país asiático ainda é fortemente controlada pelo Estado.
Embora
já pertença aos associados da OMC desde 2001, a China operava sob certa
desvantagem por ter aderido a uma cláusula do estatuto que a
desfavorecia em julgamentos de dumping. Após a expiração da cláusula, no
início de dezembro, o país esperava ser aceito como sócio pleno, porém
os gigantes julgaram que a hora ainda não havia chegado: Estados Unidos e
União Europeia disseram ainda não considerar que a China merecesse tal
reconhecimento.
Em nota oficial, o diretor-geral da OMC, Roberto
Azevêdo, confirmou a delicadeza da avaliação: “Não há uma metodologia ou
uma precisão absoluta sobre quando uma economia é de mercado e quando
não é. Não é a OMC quem diz isso, cada país determina se um determinado
parceiro comercial é uma economia de mercado ou não”, justificou.
No Especial Perspectivas José Augusto de Castro, monta o panorama. A
AEB estima que o câmbio deva permanecer entre R$ 3,20 e R$ 3,50 no ano
de 2017, embora ainda considere que deva haver novas projeções ao longo
do ano. Especialmente no comércio com a China, o câmbio não deve fazer
muita diferença, uma vez que, no caso das commodities, a taxa cambial
tem mais efeito na lucratividade financeira do que na atividade
comercial. Os manufaturados, por sua vez, deverão sofrer – ou continuar
sofrendo, já que apresentaram queda de 1,1% nas exportações, e devem
cair ainda mais. “Exportar manufaturados, especialmente para a União
Europeia, deve ficar ainda mais difícil após a desvalorização de cerca
de 20% do euro frente ao dólar”, avalia o relatório da AEB para 2017.
José
Augusto de Castro atribui a falta de competitividade da indústria
brasileira de manufaturados primordialmente ao preço – e neste, estão
incluídos não só o câmbio, mas também os custos logísticos,
burocráticos, trabalhistas e tributários, ou seja: o famoso ‘Custo
Brasil’. “Nossos montantes de exportação registrados em 2015 e 2016
estão menores do que os números atingidos em 2006, ou seja: estamos em
queda há 10 anos”, alerta. Com a falta de competitividade, continuaremos
focando nossas exportações de manufaturados no mercado sul-americano,
para o qual conseguimos suprimir alguns custos, especialmente os
cambiais e logísticos. Caso a Argentina confirme o crescimento do PIB em
3,5%, como provavelmente deverá acontecer, a AEB estima que o fluxo de
exportações do Brasil para o país vizinho deva crescer ainda mais.
Entre
as ações previstas para impulsionar o país, Castro menciona as reformas
governamentais, e acrescenta o setor portuário entre as prioridades. “O
governo acena com reformas tributária, trabalhista e previdenciária,
mas tem incluído, por meio dos grupos de trabalho, uma revisão
necessária na lei portuária, que é imprescindível para estimular a
competitividade do País”, explicou, lembrando que, no caso dos portos,
melhorar tanto a infraestrutura quanto a regulamentação é fator crucial
para gerar concorrência e baixar custos.
Diante da previsão de
fusão dos grandes armadores que operam no Brasil, após a notícia da
compra da Hamburg-Süd pela Maersk Line, José Augusto de Castro avalia,
com otimismo, que o mercado poderá se beneficiar: “teoricamente, quando e
racionalizam as operações, há redução de custos, e isso pode trazer
benefícios para o embarcador”.
Contabilizando
os fatores que poderão ter influência direta sobre as perspectivas para
2017, José Augusto de Castro enfatiza a recente decisão da OPEP em
conter a produção do petróleo, eliminando 1,2 milhões de barris a partir
de janeiro de 2017, para regulação dos preços mundiais de combustíveis.
A medida deve ter impacto, embora ainda não exatamente previsível,
tanto sobre a produção industrial como sobre os fretes mundiais de
transportes, bem como negociações comerciais globais.
O mesmo
acontecerá com os minérios de ferro, cujo setor sofreu recentemente uma
variação brutal de preços, chegando a aumentar 50%, “em caráter
especulatório”, segundo avalia José Augusto de Castro, lembrando que a
medida provavelmente pode ter sido impulsionada pelas intenções de
Donald Trump de investir em infraestrutura. “Isso nem tem muita lógica,
uma vez que é sabido que o mundo tem um excedente de produção de
minérios”. E, mais uma vez, ele relembra que as relações com a China
devem ser consideradas com bastante cautela, uma vez que o país, por
mais que venha diminuindo suas importações desse tipo de bens
estruturais para se tornar consumidor, a ainda é o grande comprador
mundial.
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