Economistas, empresários e “futurólogos” comemoraram a entrada de
2016 com um entusiasmo contido. Porém, por menos otimistas que tenham
sido as previsões, nenhuma havia contemplado a perfeita tempestade que
acabou se materializando neste ano que se encerra. Sim, os desmazelos
com a economia nos anos anteriores eram conhecidos, mas apenas
superficialmente. Era impossível prever o tamanho desse descalabro.
Porém, é o que temos. Ainda assim, nas palavras de Roberto Simonsen,
“otimismo é esperar pelo melhor, enquanto confiança é saber lidar com o
pior”. Enfim, chegamos a 2017 com perspectivas de que esse cenário sombrio poderá, inclusive, piorar. Tenhamos confiança.
A
luz no fim do túnel, surgida no meio deste ano para uma suposta
recuperação da economia brasileira, estava baseada, justamente, no que
mais a afeta – e que daria um fôlego ao nosso setor: pretendiam-se
aumentar as exportações de bens industriais e de serviços, agregando
medidas incentivadoras de maciço investimento privado internacional em
infraestrutura para a logística. Esse seria o motor dessa recuperação.
Uma
muito bem-feita análise do economista Paulo Rabelo mostra que o sucesso
de um modelo de medidas, que preveja muito menos do Estado e mais do
Privado, pode ocorrer em prazos bastante otimistas de até quatro anos,
caso implementado. A ideia era assumir essa ação rapidamente, para
recuperar o tempo perdido: equilíbrio das contas, modernização das leis
trabalhistas, tributárias, previdenciárias, da educação e implementação
de marcos regulatórios que incentivassem e dessem segurança ao
investimento privado nesse país, tão rico por natureza.
Porém,
para citar outro mestre, desta vez da música, “a vida é o que acontece
enquanto estamos ocupados fazendo outros planos”, nos ensinou John
Lennon. A história política brasileira, viciada de longa data, está
mandando uma conta que nem os mais céticos poderiam prever: travou tudo,
e está difícil de destravar.
Embora esteja claro que que a
atual crise é 80% brasileira, e que a sua solução seja interna, no
restante do mundo, as coisas não estão muito melhores. Vivemos uma crise
humanitária sem precedentes, uma perspectiva política de ruptura com o
establishment e de consequências desconhecidas, além da chegada
retumbante de inovações tecnológicas que causarão profundas mudanças, o
que continua a se materializar muito antes do esperado.
Some-se
a isso antigo otimismo trazido anos atrás pela globalização, o que não
se materializou na sua plenitude, e que acabou gerando uma
revolucionária supercapacidade histórica no mundo dos containers. Cada
vez mais concentrado em mão de poucos, por questões de sobrevivência, o
ambiente do transporte está passando por impressionantes mudanças de
paradigmas mal percebidas pela maioria. Podemos afirmar que
no universo da logística em 2016 passará para a história como o começo
de algo importante. O que exatamente esse “algo” significa – e no que se
transformará – ainda está para ser visto.
2017,
com certeza, trará mais luz sobre algumas consequências e tendências
desse fenômeno, que tem sido chamado de Revolução 4.0. Está acontecendo
na maioria dos países desenvolvidos e permanece quase à margem nos
países em desenvolvimento. Essa revolução é amplamente percebida na
indústria, no comércio, e em todos os setores como medicina,
agricultura, serviços, entretenimento, tecnologia, etc. A IoT (Internet
of Things), com impressoras 3D, cobertura de satélites, rastreando e
conectando equipamentos, aparelhos e robôs trabalhando ao lado de
pessoas, está provocando uma das mais importantes revoluções de todos os
tempos. Mudará a geografia da produção. Fará com que a mão de obra
barata já não seja importante, uma vez que robôs e impressoras 3D farão
isso em qualquer lugar. Por fim, para adaptação aos novos volumes e
fluxos de cargas, haverá mudanças importantes nas rotas de navegação.
Muitas
empresas e empregos deixarão de existir, enquanto novos surgirão.
Fusões estratégicas, como a mais recente dos armadores Hamburg-Süd e
Maersk Line, ocorrem para atender estratégias exigidas por esse novo
paradigma, que mudará a geografia do mundo. Muito se leu sobre o fim de
“uma empresa alemã, tradicionalmente moderna”.
Mas poucos perceberam os
reais motivos por trás dessa ação por parte da Maersk: brilhantemente,
os dinamarqueses juntam-se à visão de futuro que já aplicam gigantes
como Amazon, Alibabá, DHL, Google, Uber, Orbicom, entre outros novos
players, e passam a trazer a inovação para o dia a dia da logística,
todos eles se preparando para atender a essa revolução 4.0, suas
mudanças de paradigmas e alterações geográficas nos fluxos de cargas
internacionais.
Exemplos não faltam. Adiantada no
desenvolvimento tecnológico, vemos a Orbicom, que equipou 30.000 novos
containers reefer para a Maersk, com sistemas de rastreamento de
posicionamento georreferencial, que informam a outros equipamentos, em
qualquer lugar do mundo, em tempo real, a temperatura das bananas,
melões, flores, remédios ou carnes que transportam. Os “equipamentos
informados” podem interagir diretamente com esses containers
ajustando-os para obedecer a programações prévias de qualidade e
conservação, sem qualquer intervenção humana.
Do outro
lado, vemos os varejistas conquistarem seu lugar ao sol no ambiente
logístico. A Amazon já opera como NVOCC. A Alibaba tem um portal
experimental de matchmaking de carga e equipamento de transporte
disponíveis. O Google já tem caminhões trafegando sem motoristas em
Nevada, EUA. Ambev já faz transporte compartilhado com outra companhas
por redução de CO2. Algoritmos não param de serem criados para dar cada
vez mais lógica à logística.
Quase todas as compras, meios de pagamentos
e entregas serão online e just in time. Muitas serão entregues por
Google Equipments autônomos, programados por sistemas equivalentes aos
do Uber, do Tinder, do Waze, e com entrega final por Drones. Tudo com um
mínimo de interferência humana. Podemos até afirmar que a satisfação do
cliente poderá perfeitamente ser medida por movimentos da retina do
recebedor muito em breve.
Jogar
esse jogo definirá a competitividade e produtividade de um país. Mas,
no Brasil, em 2017, como se nada disso fosse importante para um futuro
possível, continuaremos a ver muitos erros estratégicos e miopias.
Enquanto o futuro acontece alhures, assistimos a um sem-fim de recursos
de sobrevivência de todos os políticos, advogados enriquecendo graças às
infinitas manobras, PECs aditadas de forma aleatória que se transformam
em autênticos Frankensteins, empresas fechando, empregos sumindo, quase
todos inadimplentes – e sem capacidade de reação.
Não veremos o país se preparar para essa nova realidade mundial. A Revolução 4.0 é dos outros. Não nos diz respeito. Em
2018, ou quando ocorrerem as próximas eleições, poderemos escolher
melhor. Poderemos optar por empreendedores ávidos por inovação, educação
e planos de vanguarda no lugar do que temos visto em quase toda a
história desse país. Mas sempre perdemos as maravilhosas oportunidades
de fazer parte do futuro, da mudança sem igual dos paradigmas de
inovação e sustentabilidade que virão por aí. O que vai acontecer por aqui, não podemos prever. O que não irá acontecer é cristalino. Saibamos lidar com o pior.
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