A Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade) recomendou a condenação da Empresa Brasileira de
Correios e Telégrafos (ECT) por condutas anticompetitivas. A decisão
será publicada no Diário Oficial da União desta terça-feira (25) e levada a julgamento no Tribunal do Cade.
Segundo
a superintendência, a investigação teve início a partir de denúncia do
Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região
(Setcesp). “A entidade alegou que os Correios estariam praticando
condutas anticompetitivas com o intuito de estender para outros tipos de
produtos o monopólio legal que possui sobre a entrega de cartas. Por
meio de ações judiciais repetidas e sem fundamento objetivo (prática
conhecida como sham litigation), os Correios estariam excluindo do mercado concorrentes que entregam tais produtos”, explica o Cade.
Além
disso, os Correios estariam cobrando preços mais elevados de clientes
que competem com a estatal no mercado. Já para as empresas não
concorrentes, os valores para os mesmos produtos eram mais baixos. Embora
não questione o direito de monopólio legal dos Correios, o Cade diz
considerar que determinadas práticas configuram condutas
anticompetitivas vedadas pela Lei de Defesa da Concorrência.
O
órgão do Cade analisou os resultados de mais de 200 processos judiciais
envolvendo os Correios nos quais se discute a extensão do monopólio
postal. A estatal perdeu a maioria das ações relativas a produtos como
boletos de tributos e faturas de água e luz impressas na hora.
Para a superintendência, a prática indicaria a realização de sham litigation
por parte dos Correios. O fato de a empresa postal insistir em um alto
número de ações e pedidos de liminar potencialmente sem fundamento
representaria um custo significativo para os clientes e demais empresas
que atuam neste setor, trazendo consequências danosas para a
concorrência, como a retirada de participantes do mercado, redução da
competição, imposição de barreiras à entrada, preços mais elevados,
menor qualidade e velocidade de prestação do serviço, e menor variedade
de opções para a base consumidora.
De acordo com o Cade, a
estratégia da litigância não é tão onerosa para a estatal em função de
uma série de fatores, como privilégios processuais e corpo fixo de
advogados para sua defesa. “A ECT, no entanto, venceu a maioria
das ações relativas a outros produtos – cartões magnéticos, talões de
cheque e entregas de motofrete. Com isso, a empresa vem conseguindo
efetivar seu monopólio legal sobre a entrega de tais objetos.
Entretanto, a superintendência constatou que os Correios não vêm
prestando alguns desses serviços da maneira como clientes demandam.”
No
caso de cartões magnéticos e talões de cheques, segundo o órgão do
Cade, há indícios de que a estatal não apresenta rastreamento e controle
de entrega, previsibilidade de prazo e agilidade, garantia de
inviolabilidade e modalidades especiais, além de não estar disponível
para entrega domiciliar em várias localidades de grandes cidades
brasileiras.
“Já no caso dos produtos entregues por motofrete, a
superintendência verificou que a ECT, a princípio, não possui nenhum
serviço com prazo de entrega semelhante e também não pode, por lei,
desempenhar vários serviços muitas vezes inclusos nesta opção, como
recebimento de quantias, coleta de assinaturas e atividades atuariais”,
diz a superintendência.
Para
a superintendência do Cade, as vitórias judiciais dos Correios em casos
sobre produtos como cartões magnéticos, talões de cheque e entregas de
motofrete, combinada com o fato de que a empresa não está prestando o
serviço de forma adequada, implicaria em uma postura contraditória que
resulta em restrição pura e ilícita à concorrência – prática conhecida
como naked restraint. Isso significa que a estatal priva as
concorrentes do direito de prestar um serviço que ela mesma não realiza,
além de também privar as pessoas e empresas consumidoras de obter o
serviço no mercado.
Além disso, segundo o órgão de regulação da
concorrência, há indícios da prática de discriminação anticompetitiva.
“Foi constatado que a rede dos Correios é a mais capilar do país,
estando presente em todos os municípios e sendo viabilizada
financeiramente por benefícios e privilégios legais, dentre eles o
monopólio sobre a entrega de cartas. Por isso, a rede da ECT
constituiria uma infraestrutura necessária para a operação de várias
empresas concorrentes, que não conseguem ter uma cobertura tão extensa.
Mas, de acordo com a investigação, há indícios de que os Correios
impedem ou dificultam o uso dessa infraestrutura por parte das outras
empresas”, acrescentou o Cade.
“No segmento de entregas do
comércio eletrônico e nos serviços voltados ao setor financeiro
verificou-se que os Correios se recusam a trabalhar com alguns
concorrentes, liberando seus serviços apenas às empresas que não
competem com a estatal”, diz a superintendência.
O processo
administrativo segue agora para julgamento pelo Tribunal do Cade,
responsável pela decisão final. Caso seja condenada, a empresa pode
pagar multa de até 20% do seu faturamento bruto no ano anterior ao da
instauração do processo, além de, se for o caso, atender a exigências
que o Tribunal do Cade entenda adequadas para sanar as condutas
anticompetitivas verificadas. Procurados, os Correios ainda não se posicionaram sobre o assunto.
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