Em decisão unânime publicada recentemente, os ministros da 2ª Turma
do Superior Tribunal de Justiça (STJ) excluíram os gastos com capatazia –
movimentação de mercadorias em portos ou aeroportos – do valor
aduaneiro, que serve de base de cálculo para os impostos incidentes
sobre a importação (Imposto de Importação, IPI, PIS-Cofins e ICMS). O
acórdão, de relatoria da ministra Assusete Magalhães, beneficia uma
importadora de Florianópolis.
Sem divergência na 2ª Turma (Resp 1626971), o STJ consolidou seu
entendimento sobre o assunto – a 1ª Turma já decidia nesse sentido. A
decisão confirma acórdão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região
pela não inclusão dessa despesa no valor aduaneiro. “Após essa decisão,
o entendimento de todos os julgadores se tornou uníssono”, diz o
advogado Eduardo Aguiar, do escritório Nahas Sociedade de Advogados.
Pelas contas da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), a
manutenção de entendimento favorável aos contribuintes pode custar R$ 2
bilhões por ano ao governo, só com IPI e Imposto de Importação. E caso
os importadores busquem o Judiciário para reaver os valores dos últimos
cinco anos, a conta seria de R$ 12 bilhões.
“Embora a Fazenda esteja perdendo nas duas turmas, ainda enxergamos
chance de reverter a questão no tribunal”, diz o procurador Clovis
Monteiro Neto, da Coordenação-Geral de Atuação Judicial perante o
Superior Tribunal de Justiça (CASTJ). Há uma aposta do órgão no
voto-vista do ministro Francisco Falcão, da 2ª Turma, em dois recursos
especiais (nº 1641228/CE e nº 15929 71/SC). Nos dois processos, porém, o
voto do relator, Herman Benjamin, foi desfavorável.
A incorporação dos custos com capatazia no valor aduaneiro é feita
com base no artigo 4º da Instrução Normativa nº 327, de 2003, e no
artigo 8º, parágrafo 2º, do Acordo de Valor Aduaneiro. O dispositivo
estabelece que é possível incluir ou excluir do valor aduaneiro os
gastos de carregamento ou descarregamento e manuseio de mercadorias até o
porto ou local de importação.
A divergência está na interpretação da expressão “até o porto”. Pela
tese dos contribuintes, nenhum gasto posterior poderia ser incluído no
valor aduaneiro se o navio já está no porto. Para a Fazenda, enquanto
não ocorrer o desembaraço aduaneiro, os gastos relativos à descarga,
manuseio e transporte no porto de origem e no porto de destino são
componentes do valor da mercadoria.
A inclusão de tais despesas representa um custo elevado para as
empresas, sobretudo para as grandes importadoras. Nos portos
brasileiros, o valor médio cobrado pelos serviços de capatazia varia
entre R$ 700 a R$ 900 por contêiner, de acordo com Antonio Costa
Ferreira, da Interbras Despachos Aduaneiros.
Para o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB),
José Augusto de Castro, com a pacificação do entendimento, caberia à
Receita desistir de incluir essas despesas na base de cálculo dos
impostos de importação. “É um custo direto para as importadoras e
indireto para as exportadoras, que importam matérias-primas”, diz.
No Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o entendimento pela não
inclusão está consolidado desde 2016, quando foi editada a súmula nº 92.
De acordo com o texto, serviços de capatazia não integram o valor
aduaneiro para fins de composição da base de cálculo do imposto de
importação.
Segundo o tributarista Kim Augusto Zanoni, do escritório Silva &
Silva Advogados, que patrocinou a ação da importadora catarinense,
embora as empresas do setor estejam vencendo essa disputa no Judiciário,
o efeito prático das decisões ainda é limitado. Isso porque o
importador é obrigado a informar ao Siscomex o valor da capatazia, que
automaticamente comporá a base de cálculo do Imposto de Importação. Caso
contrário, o sistema emitirá sinal de alerta e a carga é direcionada
para os canais amarelo ou vermelho.
“Para evitar a demora na liberação da carga, muitas empresas acabam
pagando o imposto com a base de cálculo aumentada e recorrem depois ao
Judiciário para pedir o valor pago a maior”, diz o advogado. O
escritório patrocina cerca de 50 ações sobre a matéria.
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