O Estaleiro Atlântico Sul (EAS), empreendimento dos grupos Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, em Pernambuco, vive pressionado por um
prazo pequeno e uma conta alta: se não fechar novas encomendas até 2019
restará ao negócio uma fatura de cerca de R$ 1 bilhão a quitar. Esse é o
saldo que deve ficar após receber pagamento pelos cinco navios que
ainda tem em carteira, cuja entrega será feita nos próximos dois anos.
O estaleiro corre, portanto, para não fechar as portas, mas também
para poupar seus acionistas, dois grupos enrolados pela Lava Jato, de
uma fatura salgada – por volta de 80% das dívidas são garantidas pelos
dois donos, segundo fontes a par dos números do estaleiro.
Uma das principais articulações transcorre em Brasília. Em agosto,
uma medida provisória levou pânico ao setor naval, em especial ao
estaleiro pernambucano que estava engajado em negociações para fechar
encomendas com potencial para render R$ 1,6 bilhão em receitas.
A MP do Repetro foi editada para definir regras de tributação da
atividade de exploração de petróleo, mas um de seus artigos trouxe a
isenção de impostos para importação de navios. Baqueado pela paralisação
das conversas com o cliente em potencial, que viu na medida provisória
incentivo para contratar lá fora, o EAS mobilizou-se.
Uma emenda impedindo a isenção do tributo aos equipamentos
estrangeiros foi incluída – nos corredores do Congresso, ela ganhou o
sugestivo apelido de “emenda Atlântico Sul”. Mas a tramitação ainda
causa apreensão. O texto precisa ser mantido no plenário e, por fim,
passar pelo crivo do presidente Michel Temer.
No Rio de Janeiro, o estaleiro pernambucano trava outra batalha. No mês passado,
a Agência Nacional do Petróleo (ANP) atendeu parcialmente pedido da
Petrobrás para liberá-la de cumprir conteúdo local no campo de Libra. A
ANP reduziu as exigências em diversos itens e cortou a necessidade de
contratar no Brasil o casco, parte mais importante para os estaleiros.
O EAS e o Sinaval, sindicato dos estaleiros, entraram com recurso na
agência. Ambos defendem que se feche um acordo para fixar taxa
intermediária, de 40% de conteúdo local no casco, por exemplo. Em
conjunto com a entidade setorial, contudo, o EAS mantém a disposição de
investir em outra frente de disputa, a judicial.
O Atlântico Sul sustenta que hoje consegue oferecer preço competitivo
em licitações da Petrobrás. Por isso, afirma, não há sentido em liberar
a estatal de descumprir uma regra criada pelo próprio governo. “É a
estratégia Gerdau: o preço é pouco mais baixo que o lá de fora mais taxa
de importação”, diz Harro Burmann, presidente do EAS.
Fazer frente ao preço dos equipamentos estrangeiros importados é
possível, diz o EAS, diante dos ajustes feitos na operação nos últimos
anos que elevaram a produtividade no estaleiro. Os navios consomem agora
menos de 2 milhões de homens-hora. Está longe da eficiência asiática,
onde uma embarcação é feita com menos de um milhão de homens-hora. Mas é
grande avanço para quem, em 2013, entregou um navio com quase 9 milhões
de homens-hora. Chegar ao patamar atual permitiu ao EAS cortar custos e
reduzir funcionários – alta na produtividade aliada à falta de projetos
baixou o número de empregados de mais de 10 mil em 2011 para os 3.500
atuais.
Ancorado nesses avanços, Burmann espera entregar este ano lucro após
sucessivos prejuízos. Se a previsão se confirmar, será um alívio, ainda
que pequeno, para os donos, que já enterraram bilhões no negócio. O
risco de serem chamados a colocar mais dinheiro, porém, ainda existe.
“Preciso de programação de três anos de carteira sempre. O ideal seriam
cinco. Estou no ano em que tenho de ter carteira para 2020. Se não
gerar, tenho problema”, diz.
Na movimentação para salvar seus negócios, o Estaleiro Atlântico Sul
conta com a ajuda das lideranças setoriais, interessadas em resgatar ao
menos parte da indústria naval brasileira. Além do lobby a favor da
manutenção da exigência de conteúdo local, representantes dos estaleiros
tentam conseguir com o governo novos incentivos. A proposta mais
recente encaminhada a auxiliares presidenciais é a de destinar 10% dos
recursos do Fundo da Marinha Mercante (FMM) para a renovação da frota da
Marinha do Brasil. A entidade diz que, se o plano prosperar, seriam
liberados cerca de R$ 600 milhões para a construção de embarcações.
Segundo Sérgio Bacci, vice-presidente executivo do Sinaval, o
ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, pediu ao setor ideias de
incentivos que não envolvessem contratações da Petrobrás. A proposta de
renovar a frota da Marinha já foi apresentada aos ministérios dos
Transportes e do Planejamento. “A princípio estamos sentindo que há boa
vontade”, diz Bacci.
Estimuladas pelo governo do ex-presidente Lula, empreiteiras correram
para erguer estaleiros de olho nas demandas do pré-sal. O Estaleiro
Atlântico Sul (EAS), criado em 2005, logo se tornou símbolo do plano
petista de reerguer a indústria naval brasileira. Como outros estaleiros
construídos País afora, o estaleiro de Pernambuco ganhou uma parruda
carteira de encomendas, com navios para servir à Transpetro e à
exploração do pré-sal.
A recessão e a Lava Jato vieram, a Petrobrás precisou rever planos, projetos foram cancelados e novos não vieram. Nesse ambiente, o EAS, mesmo sob risco, é um dos estaleiros em melhor
situação, já que ainda tem cinco projetos em carteira. “A grande
maioria dos estaleiros já fechou ou está sem obra. No Rio, só tem
estaleiro fazendo reparo. Vários estão apenas com equipe de manutenção”,
afirma Bacci.
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